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Entre Estrelas, Carreteiros e Almôndegas: A Minha Tia

Sabe aquele texto que tu tenta escrever e chora enquanto escreve? Aquele que faz a garganta travar, os olhos marejarem, e o coração bater mais devagar só para não doer tanto? Pois é… esse aqui foi assim. Eu começava, parava, limpava as lágrimas, voltava. Chorava de amor, de saudade, de carinho. Chorava lembrando que, às vezes, o dia passa e a gente não liga, não manda mensagem. A rotina da vida adulta engole o tempo, e a gente esquece que algumas pessoas parecem eternas. E talvez sejam mesmo, na gente.

Minha tia.
Ela é assim.
Ariana e taurina, o famoso signo duplo. Nasceu bem ali, na cúspide, no exato momento em que o céu troca de roupa. E como boa cúspide, ela carrega a ousadia de Áries com o colo quente de Touro. Ela é intensidade com afeto, fúria com doçura, liberdade com raiz. Uma fortaleza vestida de elegância.

Na numerologia, ela é um 6. O número da família, do cuidado, da mesa posta, da alma que acolhe. Mas a vibração dela tem um quê de 11 número mestre, espiritual, quase místico  e um destino número 1: pioneira, líder, determinada. Ou seja: nasceu para ser exemplo. E foi.

A mais velha dos irmãos, a que segurou a barra, a que foi abrigo quando a vida apertou. Teve uma infância difícil. Minha avó precisou deixá-la por um tempo em um orfanato, até conseguir se reerguer. Talvez tu pense: “ela deve ter se tornado uma pessoa dura, amarga”. Mas não. Ela virou fortaleza. E fortaleza não é feita de pedra, é feita de fibra.

Minha tia é a matriarca. A rainha da família. Poucas vezes a vi chorar. Mas em muitas, a vi ser o alicerce de todo mundo ao mesmo tempo. Irmãos, filhos, sobrinhos… a gente cresceu sabendo que tinha onde cair quando o mundo desmoronasse. E esse “onde cair” sempre foi ela.

Ela casou cedo, como tantas de nós. Mas não deixou que isso a definisse. Sempre nos ensinou que mulher tem de ter independência, dinheiro próprio, liberdade pra ir e vir. Quando meu filho nasceu, ela me olhou nos olhos e disse: “Tu tens família e, o principal, dois braços e duas pernas. Toma conta da tua vida.” E eu nunca esqueci.

Minha tia me ensinou a ser uma mulher negra. E olha que estamos falando dos anos 90, hein? Onde a gente mal via negros em lugares de destaque, muito menos nos ambientes que ela me levava. Me ensinava a me portar à mesa, a falar com firmeza, a andar de cabeça erguida. Me ensinava, principalmente, a jamais me diminuir.

A neurociência diz que o ambiente molda nosso cérebro, mas algumas pessoas são exceções à regra. Elas nascem com uma centelha que nem a adversidade consegue apagar. Minha tia é dessas. Ela driblou o mundo e ainda saiu elegante na foto.

Lembro de uma vez em Buenos Aires, numa viagem em família. Algumas pessoas estavam incomodadas com algo, e ela foi lá resolver. Porque se tem uma coisa que ela faz bem é proteger os pintinhos dela. Ela pode chamar no canto, puxar a orelha, dar sermão mas ninguém mais pode. Porque ninguém mexe com os dela.

E se até aqui tu achou que ela era só razão e liderança… deixa eu te contar uma coisa: minha tia faz o melhor carreteiro do planeta. Daquele com carne picada à mão, com carinho, como quem conta uma história em cada pedacinho. E as almôndegas? Ah, comer as almôndegas dela com um cacetinho (aquele pão bem nosso) é coisa de outro mundo. Só de lembrar já me dá água na boca e um nó de saudade.

Minha tia é casa cheia. É domingo com cheiro de comida, é riso alto, é história contada com detalhes e exagero. Ela ama tomar compari, ir ao cassino, apostar, rir, dançar, ela ama viajar e contar histórias de cada cantinho deste mundo. Já foi eleita uma das mulheres mais influentes, tem uma praça com o nome dela, tem reconhecimento e história. Mas pra mim, ela é, e sempre será a minha tia.

A que cuida. A que ouve. A que ensina.
A que me permite ser “a preta da tia” com orgulho.
A que acha que fez pouco por mim, mas fez TUDO.

Se hoje eu sou essa mulher negra, empresária, forte, livre… tem muito dela em mim. Muito do olhar que me ergueu, do conselho que me guiou, da mão que me puxou quando eu quase caí. Ela sempre esteve ali. Como estrela-guia. Como árvore com sombra. Como bússola interna.

Talvez eu nunca tenha dito isso. Talvez não diga o suficiente.
Mas, tia… tu és a mulher que eu quero ser quando crescer.

E se você tem uma “tia” dessas na sua vida liga. Manda mensagem. Escreve uma carta. Não deixa para depois. Porque algumas mulheres são eternas, não porque vivem para sempre, mas porque vivem dentro da gente.

Com amor, saudade e muita fome de almôndega,
da tua preta.

Fênix 520